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Nova geografia das práticas globais de arte contemporânea.


Um leitor, assíduo e comentador, me propôs, já faz algum tempo, que escrevesse sobre livros cuja leitura considero importante para a compreensão da arte hoje. Vacilei um pouco, achando que poderia ser um tema muito específico e fastidioso para o público mais amplo que pretendo atingir com esta coluna. Entretanto, a leitura e a discussão em minha disciplina “Correntes Contemporâneas da História da Arte e da Estética”, no PPG de Artes Visuais da UFRGS, do livro “The Global Contemporary and the Rise of New Art Worlds”, de Hans Belting, Andrea Buddensieg e Peter Weibel, publicado pelo ZKM, Alemanha, e MIT Press, Londres, em 2013, me fez repensar o assunto. Suas ideias são tão atuais, interessantes e esclarecedoras que talvez possam interessar a muito mais pessoas do que o restrito grupo dos especialistas.
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Para introduzir meus comentários, devo lembrar que Hans Belting foi autor, em 1983, de um polêmico e revolucionário livro intitulado “O fim da História da Arte?”, onde discute a condição da História da Arte em tempos de arte contemporânea. Este livro, com uma revisão atualizada do autor, foi publicado, no Brasil, pela Cosac&Naif, em 2006. Belting se enfrentava, já faz bastante tempo, com as problemáticas da arte contemporâneas e com as mudanças que se processam no cenário artístico mundial.
Hans Belting e Peter Weibel veem desenvolvendo, desde 2006, na Alemanha, junto ao Centro de Arte e Mídia ZKM, um projeto de pesquisa denominado Global Art and the Museum (GAM). Como resultado deste trabalho foram publicados vários livros e realizada uma grande exposição. Tanto o site da exposiçãocomo o catálogo das obras, em inglês, podem ser acessados on-line.
O livro que estou apresentando foi o último a ser publicado como parte do projeto, e contém o catálogo completo da exposição e vários documentos de pesquisa, além de excelentes e importantes ensaios. A ideia talvez não seja divulgar o livro para que muitos se interessem em adquiri-lo e lê-lo, uma vez que ele foi publicado em março de 2013, em inglês, e com 464 páginas, mas sim expor algumas de suas importantes contribuições ao debate da arte atual.
Sua mais importante contribuição, e base para todas as demais, é a compreensão da “arte moderna” como uma produção artística europeia, erudita e autônoma, que conviveu com a denominada “arte mundial”. Esta segunda englobando tudo que se produzia em termos plásticos no mundo, sob diferentes nomenclaturas como arte popular, indígena, étnica, artesanato… A arte moderna foi o ápice do grande relato que conhecemos como História da Arte, e a “arte mundial” esteve relegada ao estudo de etnógrafos e antropólogos.
A partir dos anos 1980, grandes transformações no panorama internacional deram ensejo a produções que foram derrubando esta segmentação, estabelecendo o que se denomina, hoje, “arte contemporânea global”, que abarca a produção erudita mais consagrada (o mainstream) e também tudo mais que se produz em termos de práticas plásticas no mundo. Assim, hoje em dia não se poderia falar mais em um mundo da arte, mas sim em diferentes mundos da arte, policêntricos e polifônicos. No livro, os autores destacam os mundos da arte chinesa, coreana, australiana, africana, entre outros. Deixando de lado as teorias que percebem as relações entre os diferentes mundos da arte em termos de choques ou de confluências, os autores deste livro partem da ideia de integração e assimilação. Elas seriam resultantes das disputas nesta diversificada geografia e dos complexos processos de inclusão/exclusão.
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Para a consolidação das práticas globais de arte contemporânea, fatores externos como os processos econômicos e políticos mundiais são fundamentais, entretanto os fatores internos ao meio de arte são os determinantes. Entre eles os autores destacam a equivalência de todas as mídias, que faz com que hoje não se sobreponham as chamadas artes maiores, como pintura e escultura, sobre as demais, mas todas elas – gravura, desenho, performance, instalação, colagem, processos digitais…– se misturem em uma híbrida convivência de meios. Outro fator seria a substituição da tarefa da arte de representar o mundo para passar a atuar sobre a realidade, tendo a ampliação da participação do público como um aspecto cada vez mais presente.
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Eles destacam no livro a teoria da reescritura da arte, que faz com que se torne fator determinante dos mundos da arte sua própria escrita. Ou seja, a possibilidade desses mundos da arte possuírem voz própria ao falar sobre sua produção e reescreverem sua própria história da arte – em diálogo ou confronto – com outras versões. Isso ocorre no bojo dessas novas condições, em que não vigora mais a continuidade do grande e único relato da História da Arte que todos conhecemos, mas se abre a possibilidade de reescritura de muitas histórias locais. Assim se constituem as narrativas dos diferentes mundos da arte, esparramados pelo globo terrestre, mais ou menos interconectados entre si.
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As bienais, por exemplo, são importante fator de reescritura da arte e de articulação das práticas artísticas contemporâneas globais. “ A ascensão de um sistema de bienais gerou um network de instituições que buscam identidade cultural na arte regional em busca de reconhecimento global para esse tipo de expressão”. Elas participam da construção de uma nova cartografia da produção artística global, e no livro são apresentadas em uma seção de resultados de pesquisa, onde estão mapeadas mais de 100 bienais atuantes, com pequena descrição e histórico de cada uma. Segundo os autores, entre essas novas instituições se destacam por seu papel geopolítico aquelas atuantes na América do Sul, na Ásia e no mundo árabe.
Os museus também desempenham tarefas fundamentais nessa teoria da reescritura, uma vez que estão intimamente conectados com a ascensão e legitimação dos competitivos “mundos da arte”. Seu mapeamento indica a tendência ao rompimento com um panorama global e a constituição de unidades menores, identificadas com o perfil cultural e geográfico regional. Entre os anexos apresentados no livro está uma seleção de novos museus – universitários, comunitários, particulares… – que participam nessa nova cartografia. Entre os museus ali apresentados estão os brasileiros MAC/USP e Inhotim.
Como um tema fundamental no livro é a ação dos museus, uma boa parte das reflexões é dedicada a eles e seus novos papéis nos mundos da arte. Destaca-se esta importante observação “Nenhuma tipologia atual dá conta do que representaria a diversidade possibilitada pela produção contemporânea de arte. Vários museus estão se especializando em tipos específicos de públicos”. Os autores destacam a possibilidade de constituição de diferentes tipologias, para diferentes museus em diferentes contextos. Assim, a leitura do livro nos conduz, também, a levantar questionamentos, indagações e suposições sobre como estão atuando nossos museus na construção de tipologias que possam responder às condições locais de nosso mundo da arte.
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Obs. As lâminas que ilustram o texto fazem parte da ficha de leitura elaborada pela doutoranda Bruna Fetter.

Quem tem medo de feiras de arte contemporânea?
Maria Amelia Bulhões

         Alguns se encantam, outros criticam ferozmente. Nos últimos dez anos, a expansão e a consolidação de um mercado de arte internacional têm se manifestado na emergência de inúmeras feiras de arte moderna e contemporânea no mundo. A origem delas é bem anterior, mas a cada ano novas feiras são criadas; a de Basel inaugura sua quadragésima terceira edição em 14 de junho próximo, e a ArtRio, do Rio de Janeiro, inaugurou em 2011 sua primeira edição.
      As galerias que almejam algum tipo de internacionalização encontram nas, aproximadamente 260 feiras atuantes ao redor do mundo, um espaço de difusão bastante estratégico. Ali, é possível atingir um público que, segundo estimativas, gira em torno de 20 mil ou mais pessoas, entre eles curadores, diretores de instituições, críticos, jornalistas e colecionadores privados, com vendas estimadas muito além de U$ 20 milhões. As feiras são locais de troca e diálogo, elas dão visibilidade aos artistas, possibilitam que se fechem exposições e diversos outros tipos de acordos comerciais.
Com um alto nível de concorrência entre elas, as feiras ampliam sua ação mais além da revenda de obras de arte, desenvolvendo eventos paralelos como fóruns de especialistas, que abordam temas como: colecionismo, mecenato, instituições, curadoria e mercado. Nelas são, também, apresentados livros e revistas da área, além de debates com artistas ou outras influentes personalidades do meio. As programações variam de importância de acordo ao perfil de cada uma. Assim, por exemplo, a ARCO e a ArtBA têm nos fóruns um de seus focos, enquanto outras nem os realizam. Algumas são bastante tradicionais nas obras e nos artistas apresentados, restringindo-se mais às pinturas, desenhos, gravuras e esculturas, enquanto outras se abrem para propostas mais experimentais, como performances, vídeos, instalações ou arte e tecnologia.
     Segundo George Kornis, no mercado mundial de arte, pelo critério numérico das transações, existe um relativo equilíbrio entre os principais países europeus ( Reino Unido, França, Alemanha e Itália) e os Estados Unidos, entretanto, em valor de vendas os Estados Unidos se destacam, com quase 46% do total obtido. Os leilões são os marcos referenciais nos preços estabelecidos, e mesmo nas feiras os compradores se remetem constantemente aos valores neles alcançados para definir suas compras. Esse fator dificulta um pouco a venda de obras dos artistas brasileiros, pois, em sua maioria, eles estão ausentes dos leilões das grandes casas – Sottheby’s e Christie’s.
        O mercado brasileiro está bastante longe dos padrões internacionais em volumes de vendas e de custos, e, além disso, no circuito globalizado é preciso trabalhar com artistas que tenham currículo internacional, com participação em importantes eventos de arte. Nesse sentido, as bienais de São Paulo, Mercosul e Curitiba concorrem positivamente para dar legitimidade aos produtores locais em seus processos de internacionalização. Porém, de certa forma, talvez ainda faça mais sentido, para a maioria das galerias, no Brasil, trabalhar com artistas brasileiros, focando mais no mercado interno e nas feiras locais. Um problema que talvez se evidencie com o tempo é um possível aumento da competição das galerias estrangeiras dentro do mercado brasileiro. Isso está sendo facilitado, inclusive, pela isenção de impostos obtida dos governos para as transações realizadas dentro das feiras, o que favorece bastante a entrada de galerias e artistas de outros países. Se a internacionalização pode ser vista como um campo de possibilidades por outro lado pode ser também ameaça forte de concorrência.
Balançando entre internacionalização e fortalecimento do mercado interno, foi criada a Associação Brasileira de Arte Contemporânea ABACT, que reúne 40 galerias, em todo o Brasil. A Associação tem desenvolvido diversas ações, em conjunto com a Agência Brasileira de Promoção de Exportação e Investimentos APEXBrasil, em um projeto, iniciado em 2007, de internacionalização da Arte Contemporânea brasileira. Dentro dele, galerias estão recebendo apoio para participação em feiras internacionais, e figuras- chave do circuito internacional estão sendo trazidas para conhecer melhor o meio artístico nacional, visitando bienais e feiras de arte contemporânea locais.
       Se a frequência prioritária às feiras é de especialistas e interessados na compra e venda de obras de arte, um grande público de leigos, pessoas que buscam, ali, deleitar o olhar com uma gama diversificada de trabalhos, tem aumentando gradativamente a cada nova edição desses eventos. Elas já fazem parte dos programas sociais de fim de semana de muita gente, com isso abrindo, também, uma possível nova leva de consumidores. As feiras oportunizam uma visita mais divertida e repleta de diversidades do que seria a ida a cada galeria individualmente, em suas sedes. Funcionam um pouco como shopping center, onde é possível encontrar em um único espaço uma variedade de opções.
       No geral, é possível observar que a tradição experimental da arte está sendo incorporada nas feiras, com algumas adaptações que envolvem a combinação de trabalhos mais ousados e menos mercadológicos, que funcionam como atrativos especiais, com o retorno ao objeto e a valorização da pintura e do desenho. Resistem a isso alguns setores artísticos, que crêem que elas podem se tornar um setor-chave na distribuição, o que acarretaria que a ousadia e a rebeldia percam espaço, e que as produções que fazem avançar a arte – mais problematizadoras do sistema e inovadoras – fiquem à margem. Estariam, assim, as feiras concorrendo para que se esvazie a arte de sua função crítica? Em função delas, algumas galerias estão forçando seus artistas a produzirem trabalhos mais adaptados a esse tipo de demanda, como dizem alguns de seus opositores? Por outro lado, muitos dos envolvidos na produção na distribuição e no consumo de arte não ganhariam maior visibilidade nacional e internacional através delas? Os mercados de arte locais poderiam encontrar nelas um fator de impulso para se ativarem e crescerem?
As perguntas estão no ar e as respostas não são tão simples, e, entre defensores e acusadores das feiras, esse fenômeno importante no campo da arte está em expansão, logo, é preciso olhar para ele com cuidado e atenção.

Texto completo: 
http://sul21.com.br/jornal/2012/05/quem-tem-medo-de-feiras-de-arte-contemporanea/________________________________________________________________________

Panorama 3D de Gizé, Egito



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Visita on-line à Caverna de Lascaux



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Alyssa Monks, 
Estados Unidos - 1977

 Baptism 42x56, oil on linen, 2008

   Lake George 54x80, oil on linen, 2007

 Lift 54x82, oil on linen, 2009

 Smush 40x54, oil on linen, 2008

 Steamed 64x86, oil on linen, 2009

 Trust 2010, 32x48, oil on linen
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 “Arte de Rua” à margem ou integrada?
Maria Amélia Bulhões
A reflexão sobre a cultura produzida nas ruas das cidades, tanto no Brasil como em outras partes do mundo, exige um olhar mais amplo sobre as práticas estéticas e enseja questionamentos sobre este movimento cultural, de origem bastante marginal, que vem ganhando força nas grandes metrópoles.
A arte de rua abrange trabalhos de artistas que usam os espaços das cidades como suporte para se expressar, criaram seus próprios veículos de comunicação, redes de distribuição e valores estéticos. Em experimentações individuais ou coletivas, esses criadores receberam grande influência do movimento punk, e são, eles mesmos, dos personagens do hip-hop, do skate, do fanzine e de outras ramificações, conexões e evoluções da cultura urbana. Em muitos casos, uma postura marginal é defendida como filosofia e base conceitual dos trabalhos. A arte de rua vai além do grafite, um termo que virou sinônimo da arte integrada ao movimento hip hop, pois abrange inúmeras manifestações, integrando diferentes regras, estilos e códigos de conduta. Utilizam como meios cartazes, adesivos, pincéis, stencils e até sprays, para se expressarem com as mais variadas técnicas e estilos. O circuito de arte de rua estabelece seus próprios espaços e meios de difusão, mantendo em alguns casos total independência do meio artístico oficial, com vários sites onde divulgam informações sobre este tipo de produção, como é o caso do “Zupi” e do “Tem mais“.
Também foram criadas lojas e galerias especializadas nesse tipo de trabalhos, o que evidencia a abertura de um nicho de mercado bem específico para essa arte. Além de expandir seu próprio circuito, desde o início do movimento, artistas ligados à arte de rua passaram a ocupar museus e galerias de arte conceituadas, além de participarem de filmes e documentários. Ao chegarem nas galerias, nas grandes livrarias, nas lojas de discos e de moda, e na publicidade, os personagens do movimento estabelecem novas formas de integração com o público.
Os Gemeos é um caso típico de absorção e integração ao sistema da arte. Eles participam de mostras em importantes galerias e museus no Brasil e no exterior, e fazem seus grafites em paredes de residências e espaços comerciais.
Artistas que pautam seu trabalho por posturas undergrounds e de oposição ao meio artístico tradicional, vivem conflitos quando são absorvidos e integrados ao sistema da arte. 
O maior desafio, contudo ainda é como tratar a arte de rua numa instituição oficial de arte sem que esta seja engessada no formato de uma exposição de arte convencional. 
Mas ainda ficam muitas questões. Quais os sentidos dessa incorporação, para o artista e para o público? É possível e desejável evitar modificações do trabalho original nesse trânsito ou transferência de contextos? Com que critérios estéticos e conceituais abordar essa produção? Enquanto se discutem essas questões, muito continua sendo produzido pelas ruas de forma original e descompromissada. Se serão ou não assumidas pelo sistema da arte, é um debate à parte.

Texto original e completo no link a seguir:
http://sul21.com.br/jornal/2012/04/arte-de-rua%E2%80%9D-a-margem-ou-integrada/

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E essa tal de arte contemporânea?
Maria Amélia Bulhões

Em termos de artes visuais, essa pergunta sempre vem à tona, e as respostas são diversas. Para o senso comum, contemporânea é toda a arte deste tempo; o que se produz aqui e agora, essa mescla de estilos, valores e padrões que convivem no mundo globalizado. Entretanto, será que no campo artístico funciona assim? Não, o conceito de arte contemporânea é bem específico, diferenciando-se da arte atual genericamente considerada.
Vários autores se dedicam a estudar e definir a Arte Contemporânea, cujas origens se encontram na segunda metade do século XX, com a emergência da Pop Arte. Esse movimento artístico, que incorporava ícones da cultura de massa, para com eles criar proposições ambíguas e questionadoras, inaugura um tipo de postura marginal/integrada típica da sociedade de consumo. Vários movimentos seguiram nessa linha de produção border-line, criando novas categorias artísticas, como as “performances” (espécie de ação artística momentânea, envolvendo o artista ou outras pessoas segundo sua proposição), “instalações” (construções espaciais com objetos, que fogem à classificação de escultura), “videoarte” (propostas com imagens em movimento que não se enquadram no cinema e na TV tradicionais). Em todos esses experimentos a construção da visualidade é o foco.
Assim, a arte contemporânea, instaurou uma busca constante de inovação e ruptura. Afirmando o lugar-comum e a vida real como motor de criação, a pluralidade domina esta produção, na qual não é mais possível estabelecer movimentos ou tendências estilísticas dominantes, embora algumas classificações sejam tentadas – arte povera, arte conceitual, arte relacional, etc. O desaparecimento da especificidade de suas práticas e as aproximações com o banal e o cotidiano permitem que alguns autores falem de uma arte pós-autônoma. Isso por que, ao fugir da tradição refinada e elitista dos objetos artísticos, estabelecendo fortes ligações com o mundo real, os artistas fragilizam a autonomia do campo artístico. Eles propõem rupturas com o sistema da arte, e este, por outro turno, vai aos poucos incorporando tantas e diferentes propostas que fica difícil determinar seus contornos. 
Se o regime de consumo é moderno, o regime de comunicação é contemporâneo; nele os valores artísticos se definem nas redes de relações que estabelecem valores e significações. Atividades e objetos muito diferenciados podem ser considerados artísticos, dificultando a compreensão do grande público. A comercialização permanece, ainda que com diferentes estratégias. Tem-se, por exemplo, a venda de fotos ou vídeos de performances, que aconteceram num determinado local e momento, e cuja existência se perpetua nestas imagens. O objeto vendido são os vestígios do ato efêmero, que ocorreu e que bem poucos puderam assistir. Para a realização desta comercialização, artistas e obras se articulam em diferentes conexões.
Embora haja muitos estudos e várias tentativas de definições da arte contemporânea, fica sempre difícil estabelecer parâmetros. Quem homologa o valor artístico e quem estabelece a hierarquização desses artistas e de seus produtos? Isso só se aclara um pouco quando se analisa o complexo em que se articulam marchands, curadores, administradores de museus, críticos, fundações, agentes de arte, investidores, jornalistas e até produtores culturais, que substituem muitas vezes os críticos e os historiadores da arte. O sistema da arte – grande universo simbólico – está repleto de crenças que dificultam a percepção das suas condições institucionais e das disputas sociais que nele se inserem. Segundo Anne Cauquelin, as crenças mais persistentes são: a do artista como gênio criador (responsável único pelos produtos de sua criatividade), a da imanência da obra de arte (que todos reconhecem espontaneamente) e a da universalidade atemporal dos valores artísticos.
Mesmo na contemporaneidade, em meio a tantos questionamentos, a maioria dos indivíduos ainda assume e difunde essas míticas da criação. Por isso, muitas críticas são feitas a essa produção que perdeu os contornos de seu campo autônomo, que se mistura na vida real, que desaparece sem deixar senão vestígios do que se passou. Um grande número de indivíduos se pergunta: isso é arte?
Segundo Ana Mae Barbosa, “sob a designação de arte contemporânea tem-se ainda a continuação da arte moderna, especialmente no Brasil, muito apegado ao modernismo”. A grande maioria das pessoas têm dificuldade de perceber que muita coisa interessante está sendo feita sob a designação de arte contemporânea, que os artistas procuram se aproximar cada vez mais do público, invadindo todo tipo de espaço, e o dia a dia dos indivíduos. Como prática simbólica deste tempo, essa arte tem que dizer da realidade complexa e contraditória que se vive hoje, das riquezas e misérias deste mundo global/local, das individualidades e do social. O ponto a discutir não é mais como classificar ou hierarquizar as ações artísticas, mas como deixar-se permear por elas. Como perceber suas repercussões, suas possibilidades comunicacionais e, principalmente, sua capacidade de surpreender? Num mundo em que as mídias atordoam os olhares com imagens, como pode a arte encantar ou impactar? Pode ela, ainda, obter adesões e participações?
São muitos os desafios que se colocam para os produtores, para os críticos e para o próprio público, pois abrir os olhos e o coração para essa arte não é aceitar tudo sem ordem de valores. É necessário buscar continuamente referências e informações que permitam estabelecer uma real vivência estética e caminhos de fruição. Comodismo não funciona para quem deseja uma vida rica em experiências.

Texto original e completo:
http://sul21.com.br/jornal/2012/03/e-essa-tal-de-arte-contemporanea/ ________________________________________________________________________


De médico e de louco todo mundo tem um pouco,
Maria Amélia Bulhões

Para essa abordagem, retoma-se a ideia de que Arte é uma prática social reconhecida em nossa sociedade através de um sistema de relações que envolve atores (críticos, artistas, professores,marchands etc.) e instituições (museus, galerias, universidades, bienais, etc.). Assim como cuidar da saúde não faz de alguém um médico, nem ter suas excentricidades classificam indivíduos como loucos, e também exercitar em alguma atividade prática a potência criativa estética de cada um não os habilita como artista, nem o que fazem como arte. Com isso se estaria dizendo que o que fazem ou eles em si estão aquém do artístico? Não. Simplesmente não se pode negar ou omitir que existe esta categoria social aceita e legitimada como arte e, para participar dela existe uma série de condicionantes não tanto qualitativos mais sim institucionais. 

São obras que abordam a realidade das coisas, mais além de seu significado imediato, que expõem a face escura do mundo, aquela que inquieta e desafia os homens, mas que a vida cotidiana teima em ocultar. Face escura que, recalcada, volta à superfície para afirmar a incapacidade de tudo conhecer, a impossibilidade do saber total. Que se coloca como um movimento em direção ao desconhecido, sempre em busca de novas dúvidas, para ir mais além. 

Os trabalhos de Boltansky e Bispo, apesar de suas origens diversas, foram assumidos dentro deste difuso campo denominado Arte Contemporânea. Em ambos os casos, tem-se realizações que oferecem ao espectador não apenas uma imagem ótica, trata-se de visualidades que fogem das categorias artísticas tradicionais: da pintura, da escultura, da gravura ou do desenho. Com isso confirma-se que uma prática simbólica não necessita, necessariamente, ser criada como arte, inserida no sistema de relações artísticas, mas ela pode ser conduzida a ele por vários mecanismos. 

Essa situação específica é uma construção da modernidade – a famosa “autonomia da arte” – que outorga uma identidade a esse campo das práticas estéticas. Autonomia que liberou o valor das artes visuais de uma dependência representacional religiosa ou política, deixando-a, em muitos casos, dependente de valores mercadológicos. Isso, no entanto, não deve afastar as pessoas do universo da arte em si, pelo contrário. A vivência do estético pode tornar os indivíduos mais humanos, pois, afinal, é a capacidade de simbolizar que caracteriza esta espécie. 
Mas por que o desejo de ser artista, ou de ver artistas fora do sistema da arte? A que contribui essa diluição dos contornos e limites do campo artístico? 

Apropriar-se criticamente do mundo da arte, individual e coletivamente faz parte da partilha do sensível, na linha que defende Rancière como caminho para uma sociedade mais pluralista e participativa. Entretanto, como sugere Nestor Garcia Canclini “Os artistas contribuem a modificar o mapa do perceptível e do pensável… a arte está apta, mais que para ações diretas, para sugerir a potência do que está suspenso”. Assim, o objetivo não precisa ser o de encontrar a arte fora da “arte”, mas sim aproximar-se da arte para pensar criticamente o mundo. Viver e fazer arte não é buscar o belo e formas apaziguadoras da instabilidade de ser humano, mas sim deixar-se preencher desse vazio existencial e perceber nele a beleza da imperfeição. Viver a experiência estética de forma mais radical aponta para o “dissenso”, que aceita a convivência de diferentes regimes estéticos. Como afirma Canclini, defendendo uma estética da iminência: “Os artistas, os curadores, os críticos e os públicos, podemos ser comunidades ou redes gozadoras do que se anuncia”.

Matéria completa em:
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Hélio em Adriana



“Essa instalação do Hélio Oiticica tem uma faceta que é parecer também com uma casa que foi pelos ares”, Adriana interpreta o cenário escolhido para o primeiro clipe deste CD, da música “Pelos Ares”, parceria dela com Antonio Cicero.

O assunto artes plásticas está sempre presente nos seus discos, seja diretamente nas canções [como em “Parangolé Pamplona”], seja nas citações visuais dos encartes. Quanto esse assunto participa na sua forma de compor?
Não é o assunto artes plásticas. O que me interessa são as soluções que os artistas encontram, independente da mídia que eles usam.

Fonte: http://sambaesquemanosso.blogspot.com/2005/07/adriana-calcanhotto-2002.html

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"Não é a pornografia que é obscena, é a fome que é obscena" (José Saramago)

O livro "Terra", lançado em 1997 pela Companhia das Letras, apresenta cem fotografias em preto e branco feitas no Brasil entre 1980 e 1996 pelo fotógrafo Sebastião Salgado, que  define seu trabalho como "Fotografia Militante". As fotos retratam trabalhadores rurais, mendigos urbanos, presos, garimpeiros, crianças de rua... "gente vagando entre o sonho e o desespero", como descreve o escritor José Saramago no prefácio. Um CD com quatro canções de Chico Buarque acompanha o livro, que teve lançamento simultâneo em quatro países: Brasil, França, Inglaterra e Portugal. Confira na íntegra a entrevista com Sebastião Salgado, Chico Buarque e José Saramago no Programa do Jô:










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Retratos feitos com palavras,
de Anatol Knotek por Eme Viegas


A artista Anatol Knotek é especialista em poesia visual e criou uma forma de incorporar a arte do mundo escrito em suas criações, através dessa série de ilustrações. 







Fonte: 
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Eu te conheço de muitos carnavais,

Maria Amelia Bulhões

Qual o interesse de conectar e pensar em artes visuais em tempos de carnaval? Esses dois fenômenos, que parecem à primeira vista tão distantes, podem mostrar muitos pontos de contato. Para os apreciadores desse evento, que é um dos momentos mais significativos da cultura no Brasil, estas abordagens podem ser bem interessantes. 

Segundo Dostoievski, não há assunto tão velho que não possa ser dito algo de novo sobre ele, e o carnaval é festa antiga. Estudiosos identificam suas origens nos ritos pagãos que a Igreja Católica medieval procurou controlar. Caracterizada em Veneza e Florença por festivais com desfiles e bailes de máscaras, muitos dos mais reconhecidos artistas plásticos e mestres do Renascimento deles participaram, criando cenários e todo tipo de decoração. As elites buscavam um reconhecimento social de sua distinção no luxo e na beleza desses festivais, e os artistas eram seus aliados nessa tarefa. Os mecenas, inclusive, colocavam seus quadros pintados para desfilar pelas ruas para que o povo pudesse admirá-los. As belas-artes em suas origens estiveram bastante próximas das atividades populares, servindo à Igreja e às classes dominantes (nobreza e burguesia) como instrumento de controle social. A segmentação dos públicos erudito e popular ocorreu na modernidade, quando os integrantes do campo artístico buscaram formas de autonomia, desligando-se das funções de representação.

Assim, uma primeira relação pode ser estabelecida com a participação de artistas em elaborações visuais para a grande festa. O que ainda hoje pode ser visto nas escolas de samba, em que muitos carnavalescos são artistas, com formação em artes visuais e história da arte. Além disso, é bastante destacada nas oficinas de arte de cada escola a utilização diferenciada que se faze das qua­lidades artísticas e técnicas dos colaboradores. No carnaval em, geral e, nesse barracão em particular, estabelecem-se as participações de artistas com formação específica, definindo, de acordo com as suas posições, relações entre seu trabalho e a arte. Uma grande margem de criatividade envolve cada elo da cadeia de produção, e mesmo os trabalhadores menos envolvidos nas questões de arte reconhecem, em seu trabalho a importância da criatividade. O efeito visual de uma escola de samba não pode ser considerado como produto da criação de um só ar­tista, mas o rico resultado da relação de numerosas pessoas com trajetórias e posições diversas, num processo dinâmico e coletivo. Entretanto, a participação de artistas com formação universitária e atuação profissional nessas produções, tem sido crescente nos últimos anos.

Outra relação importante entre as artes visuais e o carnaval aparece na homenagem que muitas escolas fazem para destacados artistas plásticos. Cândido Portinari, no carnaval do Rio de Janeiro, em 2012, foi homenageado pela escola Mocidade Independente. A escola surpreendeu com alegorias e fantasias criativas e de muito impacto visual. Os carros tinham imponência e bom acabamento, com destaque para as reproduções das telas “Café” e “Retirantes”. A letra do samba-enredo retoma aspectos da vida e obra desse grande artista, aproximando-o mais do público leigo.

Outra homenagem foi proposta no carnaval de 2008 pela Escola de Samba Bambas da Orgia, em Porto Alegre, que tomou como tema o Instituto de Artes da UFRGS, que naquele ano comemorava seus 100 anos. Os alunos executaram uma ala de fantasias, participando ainda da confecção de diversos carros alegóricos, e executando uma cópia de um painel do artista Aldo Locatelli. A comissão de frente (que foi escolhida a melhor do carnaval daquele ano) foi concebida e coordenada pelo professor Francisco de Assis, do Departamento de Artes Dramáticas, com a participação de alunos e membros da escola de samba. Vários participantes nas alas foram alunos e professores do Instituto. 

Muitos artistas usam o carnaval como fonte temática seja o caso dos clássicos personagens Pierrô e Colombina, ou o uso das imagens dos foliões como faz Arthur Omar em seu ensaio fotográfico “Antropologia da Face Gloriosa”. Nessa série, Omar foca o êxtase estético, a violência sensorial e social para a construção de suas metáforas visuais. O artista parte de um estudo do rosto como dimensão transcendental, elaborando uma iconografia da realidade brasileira a partir desse fenômeno que marca sua cultura. Apresentada pela primeira vez na Bienal de São Paulo de 1997, a instalação fotográfica, constava de um painel com 99 fotografias em preto e branco em grande formato. Essa série, hoje reconhecida como um clássico da fotografia brasileira, pode ser vista em livro publicado pela Cosac & Naify.

A experimentação de novas estratégias pode contribuir para que a arte tenha uma visualidade contemporânea, comprometida com seu espaço, e inserida nos grandes complexos culturais. As atuações artísticas mais significativas que se encontram atualmente emergem de flexíveis correntes hibridas e se nutrem das tensões e contradições do mundo real. São produções que, recriando tradições, tentam responder aos problemas colocados pela contemporaneidade, tanto ao nível individual quanto das coletividades. O carnaval pode ser um desses momentos de novas oportunidades visuais, tanto para os criadores quanto para o público em geral que observa. O importante é estar antenado. 

Imagens de "Antropologia da Face Gloriosa" por Arthur Omar.
Matéria completa e fonte original: 
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Happening

Em 1952 John Cage organiza o Untitled Event (Evento sem Título), com a participação do bailarino Merce Cunningham, do pintor Robert Rauschenberg, do pianista David Tudor e dos poetas Mary Richards e Charles Olsen. Ao mesmo tempo em que Cage propõe a conservação da individualidade de cada linguagem (teatro, dança, música, poesia e pintura), pela fusão destas cria uma nova linguagem. Nesta obra discutia o acaso e a indeterminação. Nenhum dos integrantes recebeu instruções de como fazer ou o que fazer, apenas uma partitura que indicava os momentos de ação e de silêncio. Pela disposição das cadeiras, os artistas podiam circular entre a plateia e ao redor dela. Cage leu textos em cima de uma cadeira, e em seguida tocou no rádio uma composição; Rauschenberg, com seus quadros no teto, escutava discos em um antigo gramofone; enquanto de cima de uma escada Richards e Olsen declamavam seus poemas; Tudor tocava um solo em um “piano preparado”; e Cunningham e outros dançavam, perseguidos por um cachorro. Havia ainda a projeção de slides e de filmes. Untitled Event repercutiu rapidamente nos grandes centros de arte do mundo, e Cage, com este evento, foi considerado o impulsionador da produção artística dos anos 60 e 70. 
Nos anos cinquenta a busca de teorias do passado, com as de Duchamp, os escritos de Artaud e Stanislavsky, do cineasta Eisenstein e os fundamentos do Surrealismo, demonstra que o que se buscava era reexaminar os objetivos da arte em um mundo pós-guerra. Entre os principais precursores da performance estão aqueles artistas – de todas as artes – que buscaram estudar novamente os objetivos da arte. Jackson Pollock (1912-1956), com sua action painting, é considerado um desses precursores. Esta técnica é uma adaptação da collage – idealizada por Marx Ernst – que faz do ato de pintar o tema da obra, e do artista o ator. O artista transita sobre grandes lonas estendidas no chão e nelas espalha sua pintura.

“No chão estou mais à vontade, sinto-me mais perto, integro-me à obra, porque posso trabalhar em torno dela, dos quatro lados e literalmente estar no seu interior” (Pollock).

Na action painting não é apenas a mão e o braço do pintor que passeiam pelo espaço artístico, mas seu corpo, embora este não seja a obra em si. Somente após a body art isto irá ocorrer. Depois das colagens cubistas de 1912 - que envolviam papéis, panos, cartas, entre outros materiais - e das futuristas, dadaístas e surrealistas, a action painting trabalha com a colagem de imagens. Em ambos os casos a colagem servia de suporte ao processo de criação. Em meados da década de cinquenta surge a assemblage (encaixes). Nela, a pintura é produzida com materiais não-tradicionais, que criam altos e baixos relevos. Historicamente, Kurt Schwitters (1887-1948) foi quem realizou as primeiras assemblages, na década de 20. Merz-bild (bild – quadro), uma delas, incluía o recorte de um jornal do Kommerz und Privatbank, do qual usou apenas as quatro últimas letras do primeiro nome. Passou a se autodenominar Merz e a toda sua obra. 

Couverture de "Typoreklame Pelikannumer", Kurt Schwitters (1923)

Merz-bau (bau – construção), 1923, de Schwitters, de início uma enorme coluna de madeira e gesso com os mais diversos e desconexos objetos, que foram achados na rua (objets trouvés), colados aos seu redor. Foi destruída por um bombardeio em 1943.

Outros artistas como Allan Kaprow, Jasper Johns, Claes Oldenburg, Robert Whitman e Rauschemberg também passaram a se dedicar às assemblagesAs assemblages de Kaprow, figura central no surgimento do happening, começam a ficar cada vez mais complexas, o que fez com que se sentisse limitado em seu processo criativo. Incorporou então à action-collage (“colagem de impacto”) a técnica de Pollock e o acaso e a indeterminação de Cage. Os elementos da obra adquirem cada vez mais “um significado que se incorpora melhor nestas construções não pictóricas do que na pintura” (KAPROW), uma vez que estas se multiplicam e se expandem. Em suas “colagens de impacto” Kaprow utilizava todos os elementos sensoriais com os quais viria a trabalhar adiante (som, iluminação). Kaprow denomina estas “colagens de impacto” de environments (envoltório), e as define como “representações espaciais de uma atitude plástica multiforme”.

Yard ("quintal"), Allan Kaprow (1961) - Kaprow se desenvolve em um plano mais experimental

Sendo assim, a collage passa de parcial e pictórica (de substâncias e imagens) para total e não-pictórica (assemblages, environments), ocorrendo ainda a colagem de mídias (Untitled Event). Tais mudanças contribuíram para o surgimento da performance. Os environments se espalham pela América, Europa e Japão, favorecidos pela Pop Art, já que esta reavalia objetos, máquinas, utensílios e formas de comunicação da sociedade de consumo. Andy Warhol e Claes Oldenburg, ambos americanos, também passam a criar environments

The Store, Claes Oldenburg (1961-1962) - loja de verdade, cujas mercadorias eram produzidas pelo próprio artista (alimentos, meias, roupas). 

Brillo Boxes, Andy Warhol (1969) - empilhamento de caixas de sabão ou papéis de parede 

Dentre os precursores da performance destaca-se ainda o grupo Gutai (Japão), que desenvolvia propostas de live art. Live art não vem apenas do fato de envolver participação do público. Ela tinha a intenção de ser tirada da vida, do cotidiano, com objetos corriqueiros e fantasias inconscientes do sono. Live art é o que falta ao environment de alguns artistas.


Laceration of Paper, Murakami Saburo (Grupo Gutai) (1955)

Electric Dress, Atsuko Tanaka (Grupo Gutai) (1956)

“Em determinado momento começaram os meus problemas com o espaço das galerias. Pensei quanto seria melhor poder sair delas e flutuar e que o environment continuasse durante o resto de meus dias. [...] percebi que cada visitante do environment fazia parte dele. Eu, na verdade, não tinha pensado nisso antes. Dei-lhes oportunidade, então, tais como: mover coisas, apertar botões. Progressivamente [...] isso me sugeriu a necessidade de dar mais responsabilidade ao espectador e continuei a oferecer-lhes cada vez mais, até chegar ao happening” (KAPROW).
Em 1959 Kaprow apresenta sua obra 18 Happenings em 6 Partes, na Reuben Gallery em NY. Era uma colagem de acontecimentos. O salão foi dividido por três paredes de plástico semitransparente. Em cada uma delas haviam cadeiras para o público e um espaço para os performers. Cada parte da performance consiste em três happenings, que ocorrem simultaneamente, com começo e fim marcados pelo som de um sino. Os expectadores podiam trocar de sala quando quisessem, mas deveriam seguir algumas instruções que receberam por escrito. A obra dura uma hora e meia. Os performers executam ações simples, como expremer laranjas e fazer a leitura de textos. Há a reprodução de filmes, monólogos, sons produzidos com brinquedos, pintura no “local marcado”. Contudo, apesar da expontaneidade aparente da obra, ela foi ensaiada durante duas semanas antes da estréia, e os integrantes do grupo seguem um roteiro minucioso. Era a primeira exibição deste tipo assistida pelo público.


18 Happenings em 6 partes, Allan Kaprow (1959)

O termo happening, cunhado por Kaprow, tornou-se básico durante certo período da arte moderna, entretanto, outros optaram por nomes diferentes: performance para Oldenburg, event para Brecht, Aktion para Joseph Beuys, dé-collage (desfazer uma collage) para Wolf Vostel. Uma declaração assinada por 50 autores de happenings da América, Europa e Japão, em 1965, assim definiu o gênero:
“Articula sonhos e atitudes coletivasl. Não é abstrato nem figurativo, não é trágico nem cômico. Renova-se em cada ocasião. Toda pessoa presente a um happening participa dele. É o fim da noção de atores e público. Num happening, pode-se mudar de “estado” à vontade. Cada um no seu tempo e ritmo. Já não existe mais uma “só direção” como no teatro ou no museu, nem mais feras atrás das grades, como no zoológico”.
O happening não é o único predecessor da performance. Em 1959 Jerzy Grotowski anuncia sua tese sobre o Teatro Pobre:
“Devemos visar a descoberta da verdade em nó mesmos, arrancar as máscaras atrás das quais nos escondemos diariamente. Devemos violar os esteriótipos da nossa visão do mundo, os sentimentos convencionais, os esquemas de julgamento”.
Em 1960 Yves Klein apresenta suas Antropometrias do Período Azul: três modelos prensam seus corpos sobre enormes telas conforme orientações do artistas, ao som da Sinfonia Monótona de Pierre Henri. As modelos eram “convertidas em pincéis vivos”, conforme Klein, e a ação levava ao extremo a action painting de Pollock.



Antropometrias do Período Azul, Yves Klein (1960)

Piero Manzoni, italiano, em 1961 apresenta sua obra Escultura Viva, onde homens e mulheres tinham partes do corpo assinadas pelo artista e assim tornavam-se obras de arte. Mas haviam limitações: só se tornavam obras de arte se adotassem certos comportamentos  ou pagassem, recebendo assim um certificado de autenticidade.



Escultura Viva, Piero Manzoni (1961)

Nesse mesmo ano ele realiza Excrementos do Artista, 90 latas contendo cada um 30g de fezes do artista, cujo preço era o do ouro. Em 1962, Klein, com Salto no Vazio, também administra um tipo de comércio: às margens do rio Sena troca sua “sensibilidade imaterial” por folhas de ouro. Mas por ser esta uma mercadoria intocável, ele atira a folha de ouro no rio e queima o recibo.

Referências
GLUSBERG, Jorge. A arte da performance. São Paulo: Perspectiva, 1987.   


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José Leonilson é nascido em Fortaleza, 1957, muda-se para São Paulo ainda pequeno, e logo cedo começa a demonstrar o seu interesse pela arte. Passa pela escola Panamericana de Arte e depois ingressa no curso de Artes Plásticas da Fundação Armando Álvares Penteado, deixando-o incompleto, para se tornar um dos grandes expoentes da arte brasileira contemporânea. Na década de 1980, faz parte do grupo de artistas que revolucionou o meio artístico brasileiro com a retomada do "prazer" da pintura, conhecido como Geração 80. Participa, em 1985, das Bienais de São Paulo e Paris. Mas é nos primeiros anos da década de 1990, que o artista firma-se como um dos destaques no panorama cultural brasileiro, com uma obra contundente, expressando como nenhum outro, os dramas e as angústias do homem contemporâneo. 
O artista falece jovem, em São Paulo, em 1993, deixando uma obra autêntica, com a qual buscou incansavelmente a intensidade poética individual. Na Bienal de São Paulo de 1998, foi homenageado com uma sala especial. A imagem de uma escultura foi o motivo do emblema do evento e o detalhe de um desenho a imagem do cartaz.

O ESPAÇO EM BRANCO EM VOLTA DOS
DESENHOS E O OUTRO LADO
O LADO ONDE A GENTE ENTRA
ÀS VEZES É QUE DEVE SE
PREPARAR PARA ENTRAR
DEFINITIVAMENTE NAS 
TELAS ÀS VEZES ESTE
ESPAÇO PERMITE NA
LONA O LINHO CRUS OU RECEBE
UMA COLORAÇÃO QUASE AQUARELA
É A MESMA COISA
AS FIGURAS PARECEM ESTAR
ENTRANDO EM ALGUM ESPAÇO
A DESCOBRIR, ACHO QUE SE FOREM 
ATENTAS, UMA HORA ELAS
ENTRAM BEM FORTES DO OUTRO
LADO SOB A FORMA DE ENERGIA
Leonilson em suas anotações, 1993



Para mais anotações e informações: http://itaucultural.org.br/leonilson/index.cfm/f/palavra/anota%C3%A7%C3%B5es
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Floria Sigismondi é diretora e fotógrafa canadense, imprime em seu trabalho um ponto vista no mínimo marcante. Nasceu em Pescara na Itália, e fica obcecada por tudo que lhe emociona; desde sua infância, quando se apaixonou pela ilustração, desenho e pintura na Ontario College of Art, posteriormente pela fotografia, ferramenta que hoje utiliza para materializar seu olhar provocativo. Conhecida mundialmente pela sua direção em clipes para Katy Perry, Marilyn Manson, David Bowie, Bjork, The Cure, Fiona Apple, Christina Aguilera, Sigur Rós, entre outros artistas do panorama pop, e por seu primeiro longa-metragem lançado em 2010, The Runways. Como ela mesmo descreve: "Crio cenários como submundos entrópicos habitados por almas torturadas e seres onipotentes", Floria.

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Antônio Parreiras

“[...] o convencionalismo algemava o artista”
(Antônio Parreiras)

Nascido em Niterói, Rio de Janeiro, em 20 de janeiro de 1860, Antônio Diogo da Silva Parreiras foi pintor, desenhista e ilustrador. Era filho de um negociante, cuja morte forçou Parreiras a alternar os estudos com o trabalho no comércio, aos 14 anos de idade. Desde a infância o artista apresentava grande gosto pela arte. Em uma passagem de seu livro autobiográfico “História de um pintor contada por ele mesmo”, publicado em 1926, ele descreve seu primeiro contato com ela:

Devia ter meus doze anos quando, aproveitando a grande sombra das duas árvores, um pintor veio armar a sua tenda de trabalho e começou a pintar [...] Em poucos dias a brancura da tela havia desapparecido e nella se via toda a Cidade do Rio de Janeiro [...] Immovel, absorto, ficava fascinado horas e horas a ver trabalhar o artista. Até hoje vejo aquella tela luminosa que me ficou para sempre delineada ao longe, como um marco do qual jamais pude desviar o olhar [...] Eis como em minha alma, pela primeira vez, penetrou um raio de luz... a primeira emoção de Arte (PARREIRAS, 1926, p. 08-09).

Seus pais não queriam que seguisse carreira artística, por isso o puseram no Liceu Popular, o melhor estabelecimento de ensino de Niterói da época, onde Parreiras não permaneceu muito tempo. Em 1880 começou a dar aulas de desenho em Magaratiba. Casou-se no ano seguinte com Quirina Ramalho, e trocou o magistério por um emprego em Nova Friburgo, não abandonando as atividades comerciais que mantinha em Niterói. Em 1882, para realizar seu ideal, vendeu uma das casas que o pai lhe havia deixado e entrou para a Academia Imperial de Belas Artes, para as aulas do paisagista alemão Georg Grimm, que em 1884 rompe com a Academia por não acreditar na metodologia de ensino da instituição e leva consigo seus discípulos, que juntos formam o chamado Grupo Grimm, integrado por Castagneto, Caron, Vasquez, Francisco Ribeiro, Antônio Parreiras, França Júnior e Thomas Driendl. Orientados pelo mestre, os artistas exercitavam a prática da pintura ao ar livre, na Praia da Boa Viagem, em Niterói. Parreiras tinha grande admiração por Grimm, o qual dizia ser um homem de “caracter excessivamente honesto e franco”, que entrava na Academia de chapéu na cabeça, mas o tirava ao entrar na choupana de um simples pescador. Era professor justo e severo: expunha ele e seus alunos a sérios riscos pela observação minuciosa da paisagem. Via-o como um grande pintor, mas não como um artista, por apenas copiar a natureza e pela “falta frequente de emotividade”. No entanto, encontrava em suas telas imensa sinceridade, condizente com seu caráter leal e simples. A última lição que Parreiras recebeu de Grimm foi meses antes da morte deste, quando então foi surpreendido em casa enquanto concluía um de seus quadros. Grimm, que voltava de uma longa viagem, visivelmente afetado pela tuberculose, após longa observação daquela tela apanhou os pincéis, fez algumas correções, e disse: “- Caminhas, progrides, tornas-te um individual; chegarás a ser um artista se nunca abandonares a natureza” (PARREIRAS, 1926, p. 18). A pobreza em que se encontrava atormentava Parreiras, que acreditava que em pouco tempo não poderia mais trabalhar. “Muitas vezes fiquei alli, naquelas praias desertas a contemplar o mar sem ve-lo... porque estava a chorar... A minha pobreza era extrema. Olhava com tristeza infinita para os tubos das tintas, quasi vasios” (PARREIRAS, 1926, p. 11). E as condições de vida da maior parte daqueles artistas era semelhante à sua. Muitas vezes limitavam-se ao desenho por não haver tinta. Sua primeira mostra individual ocorreu em 1886, na Casa de Wilde, no Rio de Janeiro, e, apesar de naquele momento suas pinturas apresentarem grande semelhança às de seu mestre, e de Gonzaga Duque, ao analisar seus trabalhos, destacar a predileção do artista pelas “cores pálidas” e “aspectos tristonhos da natureza”, a exposição foi um sucesso, e a ela se sucederam várias outras. Em 1888, após uma individual no estúdio de Insley Pacheco, Parreiras sentiu a necessidade de aperfeiçoar-se na Europa. Depois de viajar para Lisboa, Madrid, Paris, Roma, Florença e Nápoles, instalou seu ateliê em Veneza, onde frequentou a Academia e tornou-se discípulo de Filippo Carcano. Na época o realismo predominava na pintura. “A paisagem devia retratar fielmente a natureza, a figura, o modelo” (PARREIRAS, 1926, p. 71). Para evitar a miséria, Parreiras seguiu o movimento e, como os outros, copiava a natureza fielmente, linha por linha. O trabalho mecânico de copiar a natureza não o satisfazia, e certo dia, em princípios do inverno, percebeu a dificuldade em retratar, minuciosamente, as formas em constante movimento envoltas em neblina. Ela fundia os tons leves da paisagem, sem deixar contornos. As formas se perdiam com extrema rapidez, tornando impossível a cópia minuciosa daquilo, conforme a orientação artística dominante. Ainda assim, ficou fascinado com aquele efeito visual. Esquecendo tudo o que havia aprendido sobre pintura até ali, entregou-se à ela, guiado pelo instinto, numa experimentação descomprometida com cores e texturas.

Na ânsia enfrene de criar, torturado, alucinado, agarrei os maiores pincéis, largos, chatos, longos. Espremi fortemente de um jacto, tubos inteiros de tinta na paleta. Cerrei os olhos, deixando apenas infiltrar entre as pálpebras a imagem quase apagada do que abrangia o ângulo visual. Ataquei a tela, freneticamente, sem vacillações, como se nos meus pincéis já estivessem formadas as linhas, compostos os tons [...] Tudo em redor de mim se apagava dentro de um ambiente vaporoso... Tudo sem contornos... apenas ‘massas’. Então vi na minha tela a visão daquela natureza. Desde este dia, deixei de copiar para interpretar; e, para sempre, me separei de Grimm... (PARREIRAS, 1926, p. 72).

Na Europa manteve-se por dois anos, e em 1890, quando retorna ao Brasil, realiza duas mostras que causaram grande impacto. Ainda naquele ano, passa a lecionar pintura de paisagem na Escola Nacional de Belas Artes, da qual logo se afasta, revoltado com as injustas exonerações, pelo novo regime republicano, de Victor Meirelles e Pedro Américo, identificados com o antigo regime imperial. A partir daí Parreiras entrega-se novamente ao paisagismo, às pinturas históricas (que o levam ao Rio Grande do Sul e à Amazônia) e às exposições. Entre 1906 e 1919, o artista viaja com frequência à Paris, onde mantém um ateliê e expõe com sucesso nos Salons. Seu primeiro quadro histórico foi “A conquista do Amazonas”, de 1907. Feito a partir de seus estudos ao natural, o trabalho lhe proporcionou diversas outras encomendas do gênero. Seus nus, como “Fantasia” (o primeiro do artista, exposto em Paris, em 1907), “Frinéia” e “Flor Brasileira”, contribuíram para a construção de uma sólida reputação na França. Sobre este gênero de pintura do artista, Leite (1988, p. 386) destaca que “são visões opulentas de formas femininas ao abandono de sofás e divãs, em atitudes lânguidas ou lascivas muito ao gosto do 1900. Suas pinturas históricas possuíam menos interesse. Pelo “rigor de documentação” impresso orgulhosamente nas telas do gênero, o que lhe tirou toda espontaneidade, Leite (1988, p.387) ressalta:

[...] nunca foi melhor artista, o autor de sertanejas, do que quando se entregava instintivamente a evocar um trecho qualquer da natureza, sem preocupações outras que não de ordem pictórica; nem nunca pareceu mais artificial do que quando compunha suas enormes máquinas, nas quais tudo parece emperrado e morto.

Quando volta ao Brasil, em 1919, Parreiras recebe uma série de honrarias. Dentre elas, destaca-se o concurso promovido em 1925 por Fon-Fon, no qual é consagrado como o mais famoso pintor brasileiro, com quase 20.000 votos. Com uma vasta obra, Parreiras faleceu em 17 de outubro de 1937, em sua casa-ateliê na Rua Tiradentes, que mais tarde foi transformada no Museu Antônio Parreiras. Parreiras acreditava que os verdadeiros artistas eram felizes e “despidos de todo o interesse material”, animados apenas pelo vislumbre da moral que teriam depois da morte. Não envelhecem, são eternamente jovens. “Vivem em uma eterna primavera porque criam um mundo para nelle viverem, onde não há trevas – só luz...” (PARREIRAS, 1926, p. 09). Seu estilo evoluiu da imitação da natureza para sua interpretação e recriação. No início do século XX foi tido pela crítica como impressionista. Contudo, conforme Leite (1988, p. 388), “Parreiras quase sempre permaneceu imune a impactos de outros artistas, chegando a dominar uma linguagem pessoal, que submetia perfeitamente às suas necessidades”. Sua paleta passou de cores pálidas à cores mais intensas em suas obras mais típicas. Após 1927, em função da idade, sua pintura tornou-se mais discreta. Em sua autobiografia Parreiras faz uma dedicação à seu filho Dakir, pintor que mais tarde imitou o estilo do pai: 

Nasceste, cresceste e homem te fizeste no meu ‘atelier’. Foste sempre testemunha ocular de todos os meus actos. Muitas vezes me viste torturado pelas injustiças, martyrisado cruelmente pelas luctas; nunca porém me viste enfraquecer, abandonar os meus pincéis, maldizer a Arte. Ao contrario, sempre me viste por ella sacrificar tudo e a ella dedicar todas as forças de minha alma e da minha vida (PARREIRAS, 1926, p. 05).

"Iracema", de Antônio Parreiras (1909)
"Fim de Romance", de Antônio Parreiras (1912)


Consideradas inovadoras para os padrões acadêmicos da época, as paisagens de Parreiras apresentam certa ousadia por suas pinceladas soltas, parecendo manchas de grandes proporções. Aliás, foi nesse sentido que sua obra evoluiu, tornando cada vez mais livres suas pinceladas e mais claras e luminosas as suas cores. Apesar do pouco prestígio como tema, de acordo com a hierarquia neoclássica, a paisagem vai dominar a grande maioria dos trabalhos de Antônio Parreiras, intencionalmente preocupado em distinguir a natureza como referência tão fundamental para a pintura quanto a representação da figura humana” (FILHO, 1986, p. 38).
  
REFERÊNCIAS
FILHO, Paulo Venâncio. Antônio Parreiras. In: ____________. Projeto arte brasileira: academismo. Rio de Janeiro: FUNARTE, 1986.
LEITE, José Roberto Teixeira. Dicionário Crítico da Pintura no Brasil. Rio de Janeiro: Artlivre, 1988.
PARREIRAS, Antônio Diogo da Silva. História de um pintor contada por ele mesmo. Niterói: Do Autor, 1926. 

Produção do Banco de Imagens do Programa Institucional Arte na Escola - UNIVILLE. Acadêmica Caroline Corrêa da Silva, 3° ano, Artes Visuais.



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"Nest Hair", de Audrey Kawasaki (2006)

"Blue Girls", 2005



Audrey Kawasaki é desenhista e ilustradora, natural da cidade Los Angeles, Califórnia. Suas pinturas são feitas em óleo e grafite sobre telas de madeira, e possuem um forte apelo homoerótico. Nota-se em seus traços a influência do estilo japonês Mangá e da Art Nouveau, percebida nas curvas sinuosas das meninas e mulheres retratadas em tons pastéis. Kawasaki representa o feminino com certo ar de fragilidade e inocência, sempre com um toque erótico. Ela cria um efeito encantador misturando tons leves, traços delicados e curvas deslizantes sobre um suporte de natureza rústica. Outra característica marcante em seus desenhos é o olhar melancólico das personagens, que por vezes dividem o espaço com aranhas, centopéias e besouros, criando um ar perturbador em sua criação. No site da ilustradora você encontra imagens de seus trabalhos e mais informações sobre ela: http://www.audrey-kawasaki.com/

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Para visualizar a Capela Sistina em 360º graus sem ir ao Vaticano, clique na imagem abaixo. 



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A Síndrome de Stendhal caracteriza-se pelo surgimento súbito de diversos sintomas simultâneos (vivências estranhas, por vezes acompanhadas de sintomas físicos, sensação de profunda emoção, seguida de um leve entorpecimento, desorientação têmporo-espacial momentânea, sudorese profusa e desrealização) mediante a exposição do indivíduo à contemplação de uma ou mais obras de arte.
Esta Síndrome recebeu o nome de Stendhal, pseudônimo do escritor que em 1817 foi à Florença (Itália) e ao visitar a igreja de Santa Croce foi tomado de estranha combinação de sintomas e emoções, com palpitações e tonturas.
Fiódor Mikhailovitch Dostoiévski diante do quadro O Cristo Morto, de Hans Holbein, num museu da Basiléia, apresentou a Síndrome de Stendhal também. 
Sua esposa registrou em diário a perturbação do escritor:


Hans Holbein.
The Body of the Dead Christ in the Tomb.
1521.
Oil on wood.
Kunstmuseum Basel, Basel, Suíça.

"A visão do rosto inchado de Cristo após seu martírio desumano era terrível. (...) Fiodor permaneceu em pé diante do quadro com uma expressão oprimida. Olhá-lo me fazia mal, então fui para outra sala. Voltei 20 minutos depois e ele ainda estava lá, na mesma posição diante do quadro. Seu olhar exprimia medo. Levei-o para outra sala, ele se acalmou lentamente, mas insistiu ainda em tornar a ver o quadro que tanto o perturbara".

Em 1989 a psiquiatra italiana Graziella Magherini após catalogar 106 casos de pacientes, todos eles viajantes que foram a Florença pela primeira vez. A Dra. Graziella então percebeu que uma vez exposta a obras de arte a pessoa apresenta: angústia, confusão mental, senso de desagregação (despersonalização, desrealização), ilusões e alucinações, ataques de pânico (vertigens, taquicardia, falta de ar, medo de morrer....). É evidente que somente estão propensos à síndrome os que valorizam as artes.
Algumas pessoas chegam a pensar que estão enfartando, outras desmaiam, há as que apresentam dissociações e saem vagando pela cidade como errantes e aquelas que apresentam sintomas psicóticos chegam mesmo a tentar destruir as obras de arte.

Fonte: http://dicionariodesindromes.blogspot.com/2010/01/sindrome-de-stendhal.html

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 1487, O Homem Vitruviano de Leonardo da Vinci

O termo cânone apresenta significados distintos relativos à beleza ou às obras de arte. Da Antiguidade Clássica ao Renascimento, referia-se a um conjunto de regras de proporção estabelecidas (para edifícios e para a figura humana) que deveriam ser seguidas em busca de um ideal de beleza. Ex.: a cabeça deveria corresponder à oitava ou a décima parte do corpo inteiro. Por cânone entende-se ainda um conjunto de obras (literárias ou artísticas) reconhecidamente autênticas – como as obras de Shakespeare que a crítica reconhece como realmente escritas por ele -, ou cujo conhecimento é tido como desejável ou obrigatório. Carchia ressalta ainda que “toda a aprendizagem da história literária e artística pressupõe e alimenta um cânone” (2003, p. 60). Diante disto, surge no fim do século XX, sobretudo nos Estados Unidos, uma discussão crítica em torno dos cânones estabelecidos, colocando-os como a afirmação de um grupo de poder no qual predominavam homens e brancos, “expressão de uma civilização machista e eurocêntrica” (CARCHIA, 2003, p. 61). Apesar disso, a análise das diversas noções de cânone percebidas em épocas e sociedades diferentes permite um comparativo dos gostos e valores predominantes em cada momento. Na arte contemporânea, por exemplo, este conceito encontra-se abandonado, permanecendo o termo apenas em contextos historiográficos ou documentais.

(CARCHIA, Gianni; D’Angelo, Paolo. Dicionário de estética. Lisboa: Edições 70, 2003).            

Produção do Banco de Imagens do Programa Institucional Arte na Escola - UNIVILLE. Acadêmica Caroline Corrêa da Silva, 3° ano, Artes Visuais.

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"In Absentia MD" (detalhe), de Regina Silveira (1983)

“A noção de ‘obra de arte’ é moderna, sendo reforçada pelo conceito de museu como repositório definitivo do belo. Um certo público, entusiasticamente interessado em prostrar-se em atitude de reverência diante do altar da beleza, dela se aproxima sem se dar conta de um ambiente inacreditavelmente feio. Tal atitude afasta a arte do essencial, confere-lhe uma aura de algo especial e inconsequente a ser reservado apenas a uma elite e nega o fato inquestionável de quão ela é influenciada por nossa vida e nosso mundo. Se aceitarmos esse ponto de vista, estaremos renunciando a uma parte valiosa de nosso potencial humano. Não só nos transformamos em consumidores desprovidos de critérios bem definidos, como também negamos a importância fundamental da comunicação visual, tanto historicamente quanto em termos de nossa própria vida.” 

(DONDIS, Donis A.. Sintaxe da Linguagem Visual. São Paulo: Martins Fontes, 1997).

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 "Os Cinco Sentidos", de Hans Makart

“Por que as obras de arte são feitas para os olhos e os ouvidos em geral e não para o nariz, os dedos ou a língua? Por que não é possível comer ou cheirar o belo? Provavelmente porque visão e audição são considerados os sentidos mais ativos, aqueles que mais se aproximam do pensamento e da razão. Existe em nossa cultura uma certa hierarquia dos sentidos. Essa hierarquia pode ser constatada na série Os Cinco Sentidos, do pintor austríaco Hans Makart (1840-1884). Em todas as figuras vê-se uma mulher nua; a especificidade de cada um dos sentidos é composta pelos objetos, um espelho ou uma fruta, e pela postura da modelo, ouvindo um som ou cheirando uma flor. Observe que no quadro que representa a visão o corpo da mulher está de frente para o observador; na audição e no olfato, de lado; finalmente, no paladar e no tato, completamente de costas. Esse movimento giratório parece sugerir uma progressão decrescente de uma maior abertura do corpo para o mundo, na visão, até seu estreitamento em si mesmo, no tato.”

(FEITOSA, Charles. Explicando a Filosofia com Arte. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004, p. 113).


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Almeida Júnior. Caipira Picando Fumo, 1893


Nesses variados enfoques sobre o tempo, um se apresenta de forma muito forte, [...] o descanso (LOURENÇO, 2007, p. 99).

Pintura realizada na fazenda Pedra Azul, em Itu, e exposta em 1894 no Salão Nacional de Belas Artes, ao lado de outras do artista como Leitura (1892), A Pintura (alegoria) (1892) e Amolação Interrompida (1894), sendo  Caipira Picando Fumo (1893) considerada uma das principais obras regionalistas de Almeida Júnior. Segundo Antonio “[...] representa um dos momentos mais altos de sua preocupação em fixar o caipira paulista” (1983, p. 93). Em 1905 o quadro é transferido do Museu Paulista para a Pinacoteca do Estado de São Paulo. O caipira retratado, Nhô Joaquim - mais conhecido na região pelo apelido de 4 paus, em referência a carta mais alta do truco e provavelmente uma de suas habilidades – era um homem alto, esguio e reservado, que morava com a família num rancho da fazenda, onde plantavam o suficiente para comer e de lá não saíam para lugar algum, com exceção de 4 paus, que conhecia toda a vizinhança. Andava sempre descalço e de chapéu na cabeça, esbanjando bom humor por onde passava. Para a execução da tela, Almeida Júnior instalou Nhô Joaquim no terreiro da casa, e da janela da sala de jantar realizou a pintura. “Realista, os personagens do pintor são gente de carne e osso, que conheceu pessoalmente, gente que tinha nome, comia, vivia, amava.” (LEITE, 1988, p. 19). Tal realismo destaca-se também na leitura de Rodrigo Naves. Segundo o autor,          
           
O sol forte não parece incomodar o homem sentado nos degraus da casa. Uma tarefa singela concentra toda sua atenção: picar fumo, atender a um pequeno vício [...] O alheamento reduz sua presença física e torna-o menos suscetível ao calor, em proveito de um momento de intimidade, de quem se vê entregue ao ritmo errante das divagações. Ao fundo, a porta entreaberta e a sombra do interior da habitação reforçam a atitude ensimesmada do caipira, como se o abrigo físico da casa ecoasse a proteção evocada pelo recolhimento psicológico, numa quase figuração do que costumamos chamar ‘interioridade’. Apenas essa intimidade protetora separa de maneira mais acentuada o caipira do ambiente em que se encontra, e o resguarda da indiferenciação que permeia toda a tela (NAVES, n. 73, nov. 2005, p. 135-136).      

Na Pinacoteca do Estado de São Paulo encontra-se também o estudo da mesma, medindo 70x50cm. A diferença mais notória entre os dois quadros é o clareamento geral da obra final em relação ao seu estudo, o qual apresenta contrastes mais definidos e volumes mais acentuados, destacando a figura do caipira de seu fundo. No estudo, ainda, a figura do caipira ocupa a maior parte da tela. Outro detalhe que pode-se considerar nesta diferenciação é a sombra introduzida no canto inferior direito da tela definitiva - inexistente no estudo –, que intensifica a luminosidade da obra. Conforme destaca Naves sobre a obra final,  

Prensada entre a sombra do telhado ao alto e a das folhagens no canto inferior direito, a região de luz funciona como uma estufa. E então fica difícil não associar a desolação da cena à intensidade do clima [...] Nesta tela o homem sofre o meio, em vez de determiná-lo (n. 73, nov. 2005, p. 137).

Para Monteiro Lobato, a versão definitiva é inferior ao seu estudo, uma vez que aquela acaba por perder o frescor de um estudo livre para tornar-se uma obra com fins comerciais. Contudo, para Naves (n. 73, nov. 2005, p. 136), “[...] se a versão definitiva pode ter perdido algo do frescor do estudo livre, ela ganhou muito em realismo e em consonância com o tema”. Ainda sobre a versão definitiva, este autor afirma que,

Fisicamente também o homem se distancia pouco desse meio rude. A roupa simples está gasta como aquilo que o cerca [...] Nada se afasta definitivamente do chão. As partes descobertas do corpo do caipira também têm um tom próximo ao da terra. Crestada pelo sol, sua pele revela a aspereza da vida passada compulsoriamente junto à natureza. As mãos e, sobretudo, os pés sofreram no contato constante com o meio, e se deformaram, adquirindo um aspecto erodido e arredondado dos elementos submetidos longamente à força dos elementos [...] A luz forte e os tons muito aproximados tendem a romper ameaçadoramente a distância entre todos os elementos do quadro (n. 73, nov. 2005, p. 136).


"Caipira Picando Fumo", 1893
Óleo sobre tela. 202x141cm. Pinacoteca do Estado de São Paulo.
  
 "Caipira Picando fumo" (estudo), 1893

REFERÊNCIAS
ANTONIO, Jorge Luiz. Morte e glória de Almeida Júnior: 1850-1899. Itu: Prefeitura Municipal, 1983.         
LEITE, José Roberto Teixeira. Dicionário crítico da pintura no Brasil. Rio de Janeiro: Artlivre, 1988.     
LOURENÇO, Maria Cecília França. Almeida Júnior: um criador de imaginários. São Paulo: Pinacoteca do Estado de São Paulo, 2007. 
NAVES, Rodrigo. Almeida Júnior: o Sol no meio do caminho. Novos Estudos, São Paulo, n. 73, p. 135-148, nov. 2005.       
PHILIPPOV, Karin. A Saudade de José Ferraz de Almeida Júnior: uma análise dos aspectos iconográficos.   Campinas: IFCH – UNICAMP, 2007. Disponível em: <http://www.unicamp.br/chaa/eha/atasIIIeha.html#P>. Acesso em: 16 novembro, 2011.

Produção do Banco de Imagens do Programa Institucional Arte na Escola - UNIVILLE. Acadêmica Caroline Corrêa da Silva, 3° ano, Artes Visuais. 


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 "As artes têm um desenvolvimento que não se origina somente a partir do indivíduo, mas também de uma força acumuladora, da civilização, que nos precede... Um artista talentoso não pode simplesmente fazer o que lhe agrada. Ele não existiria se usasse apenas os seus talentos. Não somos os mestres do que produzimos. O que produzimos é imposto à nós."

Arthur C. Danto em:
Após o Fim da Arte - A Arte Contemporânea e os Limites da História.

Página 49.

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"Uma grande pintura é uma extraordinária concentração e orquestração de impulsos e informações artísticas, filosóficas, religiosas, psicológicas, sociais e políticas. Quanto maior o artista, mais cada uma das cores, linhas e gestos se tornam ao mesmo tempo uma corrente e um rio de pensamentos e sensações. As grandes pinturas condensam momentos, reconciliam polaridades, sustentam a fé no potencial inexaurível da arte criadora. Como resultado, inevitavelmente tornam-se emblemas de possibilidade e poder".

Michael Brenson - New York Times em:
Após o Fim da Arte - A Arte Contemporânea e os Limites da História de Arthur C. Danto. 
Página 201.
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"Natureza-Morta: Alegoria Sobre as Vaidades da Vida Humana", de Harmen Steenwyck (1640)

As pinturas classificadas como naturezas-mortas representam objetos inanimados. Este estilo de pintura, diferente de outros como o religioso ou mitológico, está fundamentalmente ligado ao mundo real, valendo-se, frequentemente, de um alto grau de realismo. Segundo Sturgis (2002, p. 220), “a simplicidade da natureza-morta é enganadora porque os objectos retratados raramente são neutros”. Muitos destes objetos possuem significado simbólico: caveiras, velas apagadas e relógios, por exemplo, simbolizam a brevidade da vida humana; artigos de luxo lembram a futilidade das buscas materiais. Apesar de o termo ter sido cunhado apenas no século XVII, quando os artistas passaram a pintar flores, alimentos e outros objetos de forma independente, já na Antiguidade Clássica são encontradas pinturas neste estilo: na Grécia Antiga, por exemplo, os artistas representavam objetos simples do dia-a-dia em pinturas de murais, mosaicos e painéis (estas pinturas não resistiram ao tempo, mas foram descritas por autores clássicos, que ressaltavam sua capacidade de enganar o expectador, o que sempre foi um dos principais objetivos das naturezas-mortas). Na Idade Média e no Renascimento estes objetos continuaram a ser executados, mas não mais de forma independente. Quando surge no século XVII a natureza-morta como um estilo com direito próprio, popularizou-se rapidamente, principalmente dentro de um mercado que encontrava-se em desenvolvimento. Entretanto, como ressalta Sturgis (2002, p. 221) desde o princípio foi “desdenhada”. Conforme este autor, a natureza-morta “era vista simplesmente como uma arte de imitação, que exigia uma boa coordenação de mão e visão e capacidades técnicas sofisticadas, mas nenhuma originalidade de pensamento” (STURGIS, 2002, p. 221). Dentro da hierarquia de gêneros estabelecida pela Academia Francesa de Pintura e Escultura, na década de 1660, ela foi colocada no mais baixo nível das categorias de pintura. No século XVII, com o declínio do poder das academias e o crescimento de um mercado de arte independente, as naturezas-mortas passaram a ser vistas com outros olhos. Surge nesta época na Holanda, onde o gênero se desenvolveu em diversas direções, um mercado de arte moderno, que incluía vendedores de quadros e casas de leilões. Segundo Sturgis (2002, p. 223), “os novos colecionadores favoreciam as obras mais pequenas baseadas no mundo real, que não exigiam o conhecimento de obras literárias, exerciam uma atracção mais imediata e, sendo mais pequenas, eram mais adequadas para casas de tamanho mais modesto. A natureza-morta tinha ainda o benefício de poder mostrar objectos caros que estavam para além dos meios daqueles que compravam os quadros”. Cézanne e, posteriormente, os cubistas, exploraram o gênero, atraídos por seu caráter de representação do mundo real. 

(STURGIS, Alexander. Compreender a pintura: a arte analisada e explicada por temas. Lisboa: Estampa, 2002).        

Produção do Banco de Imagens do Programa Institucional Arte na Escola - UNIVILLE. Acadêmica Caroline Corrêa da Silva, 3° ano, Artes Visuais.

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